terça-feira, dezembro 10, 2024

Para Silvia Regina, com amor


Eu, em Londres, em 2013, na entrada do edifício onde estava hospedada

Em 2013 eu tinha 55 anos e escrevi uma carta para a Silvia Regina de 13 anos, que estava se formando no ensino fundamental (era o ginásio, na época). Hoje, aos 66 anos, que aprendi que é uma capicua, decidi escrever para a Silvia de 55 anos. O resultado é o seguinte: 

Oi, Silvia Angerami,

Aí está você pela segunda vez em Londres, em uma viagem maravilhosa. Sabia que você tem essa meia calça e a camiseta até hoje? A saia era tão linda, mas já se foi. Nessa época, você ainda pintava o cabelo com tonalizantes. Achava que era preciso, por exigências profissionais.

Mal sonhava você que a sua vida ia mudar tanto... Você conseguiu separar-se do seu marido, porque o casamento, vamos combinar, não era aquela maravilha que todos pensavam que fosse. Foi-se criando um fosso intransponível entre vocês, parecido com o que você viu a+i no castelo de Londres. Os valores foram se distanciando, a vida que ele levava não se parecia com a vida que você queria pra você. Até que 5 anos depois dessa fotografia você decidiu que o casamento havia chegado ao fim. Ele não queria aceitar, você ainda passou mais um tempo vivendo com ele sob o mesmo teto, mas afinal, veio a separação definitiva. Você encontrou a paz novamente e estava bem feliz sozinha.

Mas sabe que uma amiga sua que é jornalista como você, mas também numeróloga e taróloga te aconselhou a abraçar novamente o seu segundo nome, o Regina, e a sua vida deslanchou melhor depois disso? Ela também previu o segundo casamento, mas você, naquela época, não acreditou.

Você encontrou um rumo profissional por sua conta, fez livros e os lançou pela sua editora, reuniu autores iniciantes em torno de coletâneas originais e criativas, fez parcerias, encontrou novas amizades, e depois descobriu que o conceito de amizade é diferente do de meros conhecidos. Sofreu com essa descoberta, mas reorganizou a sua vida e acabou encontrando o maior amor da sua vida em Portugal, para onde se mudou e está a viver uma vida simples, mas cheia de dignidade e de amor.

As coisas tomaram rumos inesperados e nem tudo saiu como planejado. Aliás você, aí nos seus 55 anos, já sabia que a vida não é mesmo muito fácil. No entanto, você está aprendendo que tem coisas que você pode mudar, mas outras, não. Então, o jeito é aceitar e continuar a ter a ilusão que você é quem faz as escolhas e toma as rédeas da sua vida, quando, no fundo, você passou a acreditar mais no Destino do que no aclamado Livre Arbítrio.

Agora, você tem 66 anos, e aprendeu que quando os números se repetem dessa forma se chama capicua. Era suposto que desse sorte. Mas este ano está a ser particularmente desafiador. Nem tudo são rosas. Você não tem a mínima ideia do que vai acontecer no futuro, mas procura fincar os pés teimosamente no presente e ir vivendo cada dia de uma vez, como naquele filme Dias Perfeitos, do diretor Win Wenders, em que ele narra a história de Hirayama, um japonês que aparenta encontrar a felicidade numa vida simples, mas solitária.

Só que quando a gente prefere a companhia de alguém à solidão, as coisas sempre são mais complicadas. Ainda assim, você está convicta das suas supostas escolhas e alimenta sua fé em um futuro mais calmo e sossegado, na última fase da sua vida.  

Como será que estará a sua vida aos 77? Só Deus sabe.