quarta-feira, maio 15, 2019

Faxina, eu??



Quando eu era menina, estudante, não queria saber de fazer faxina e nem de arrumação de nenhuma espécie. Meu guarda-roupa era um emaranhado de roupas que eu ia “socando” lá, sem nenhum método. Minha mãe queria o quarto arrumado e eu enfiava e escondia a bagunça toda dentro do armário. Minha avó paterna também morava com a gente e ela me defendia: “Ela vai ter empregada, não precisa aprender a cozinhar nem fazer faxina”. E eu acreditava piamente nisso. Minha mãe respondia: “Ela tem que aprender para saber mandar, pelo menos”. Entrava por um ouvido e saia pelo outro. Eu era boa aluna, era considerada inteligente pelos professores, tirava boas notas, achava que o meu caminho para o sucesso profissional estava pavimentado e que eu naturalmente e sem nenhum esforço teria um ótimo emprego e um excelente trabalho, que nem o meu pai. Meu pai não era engenheiro, mas era tão competente e inteligente que tinha sido contratado como engenheiro na Refinações de Milho Brasil, tinha um ótimo salário e a minha vida infantil foi tranquila e confortável.
Mal sabia eu que a minha vida não seria esse mar de rosas, profissionalmente falando. Metida, eu me achava muito importante já desde o meu primeiro emprego, um estágio no DSV onde eu tinha que me humilhar e fazer chatíssimos relatórios de rádio-escuta. Aquilo era a morte pra mim. Zero de criatividade, zero de inteligência. Apenas um trabalho braçal. Eram 5 cópias desse maledeto relatório, com papel carbono. Cada cópia tinha um destino.... Certo dia, estava eu a distribuir as cópias para os respectivos destinatários, quando a secretária de um deles (por sinal, uma jornalista a quem vou poupar a identidade), jogou o meu relatório na lata de lixo na minha frente, dizendo que o chefe dela não lia aquilo.
Ohhhh!!!! Fui correndo contar ao meu chefe. A partir do dia seguinte, eram só 4 cópias.
Bom, isso foi apenas no primeiro emprego. E a história não foi muito diferente nos demais. Eu sempre ficava na minha plataforma da superioridade, olhando de cima até os meus chefes. Resultado: nunca me dei bem. Nunca soube fazer a política necessária para galgar posições. Desempenhava tarefas que me aborreciam e me sentia menosprezada, diminuída. Foi sempre assim. Fazia tudo sem alegria, sem paixão, sem amor. O salário no fim do mês era correspondente a esse meu comportamento e sentimento.
Hoje, moro em um apartamento pequeno, vivo (eu e meu marido) de aposentadoria. Ou seja, adotamos o estilo minimalista, que tá na moda, é bacana e tem a ver com o nosso rendimento mensal, que – claro – não é lá essas coisas. Mas tá tudo bem. Não temos mais tantas despesas. O clube agora é grátis, não tenho vontade de comprar nada que seja de grife e sim do pequeno, não temos mais o sonho da casa própria (nossa casa está alugada e pagamos o aluguel deste apê com o dinheiro recebido lá). Além disso, passei a ser a pessoa mais organizada do mundo, fã de carteirinha da Marie Kondo e das suas dicas. Aprendi, recentemente, a dobrar as camisetas no seriado dela no Netflix. 


Não tenho empregada e nem faxineira. No começo, eu esbravejava quando fazia a faxina. Imagine, eu, jornalista graduada pela ECA-USP, com curso de especialização também na ECA-USO, tendo que me sujeitar ao aspirador de pó, ao esfregão e aos produtos de limpeza! Revoltadinha, eu fazia a limpeza resmungando. Só que no final, acabava descobrindo um sentimento bom de autossuficiência, de liberdade, de independência, de ninguém ter que limpar a minha sujeira.
Resolvi dedicar as quartas-feiras pela manhã à faxina. Fui descobrindo que não é um bicho-de-sete-cabeças. Fui percebendo, aos poucos, que por mais que não seja uma tarefa criativa, pois é extremamente repetitiva e até um pouco pesada, dá prazer estender o lençol limpinho na cama, depois de tudo limpo e cheiroso.
Fui vendo que, conforme a gente vai limpando o nosso ambiente externo, também as ideias e sentimentos vão sendo limpos, higienizados.
Fui notando que a faxina tem valor, que mexer nos nossos objetos, analisando a cada semana se eles nos trazem felicidade, é uma ação que só nós podemos fazer. Não tem como delegar isso a quem quer que seja. É só pegando objeto por objeto, passando um pano ou lavando, para tirar o pó, é que vamos nos conectando ao nosso espaço onde vivemos e convivemos com as pessoas que escolhemos dividir o teto. Assim, comecei a sentir um enorme prazer nessa atividade, que continuo a desempenhar religiosamente todas as quartas pela manhã. Me sinto leve, me sinto feliz, sinto um prazer muito grande em fazer as atividades que uma casa exige para que possa ser chamada de lar.
E o sentimento que fica, depois de todas essas minhas confissões, é de uma profunda gratidão. Sou grata a Deus pela minha vida, pela minha saúde, que me permite fazer esta faxina cuidadosa, sem depender de ninguém, sou grata à minha mãe que queria me ensinar (e continua até hoje me dando dicas de produtos de limpeza, de técnicas e dicas – como, por exemplo, usar vinagre de arroz para limpar a pia e o fogão), sou grata à minha avó que me defendia, com a melhor das intenções. Sou grata pela minha casa, este apartamento novinho em folha e pequenininho, onde moro há menos de um ano e que tem tudo a ver com a nossa fase atual. E sou extremamente grata ao meu marido que é um maridão e que me ajuda, com aquele jeito dele, todo afobado, sem frescura, repetindo que “não tem tempo ruim”, sei que ele tem um coração enorme e que também quer se sentir bem aqui dentro.
Fico aqui a refletir sobre aquele ditado popular: Deus escreve certo por linhas tortas. Mas acho que nós é que somos os burros de não entendermos que as linhas de Deus nunca são tortas. Nossa visão é que distorce a realidade. E a realidade sempre traz o bem. Nós é que precisamos ter “olhos de ver”. Precisamos ver e enxergar que a vida sempre é boa, sempre nos traz aquilo de que precisamos. E as lições nos chegam o tempo todo. Podem vir até da prosaica faxina semanal. É isso....

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