O Consulta Sentimental tem a enorme honra de publicar (com um atraso imperdoável!) o texto da minha mais querida colaboradora Luciana Praxedes.
Aproveite!
Lucas
─ “Você irá chorar quando o
médico chamar seu nome?”
─ “Acho que não, nem deve
doer, acho eu”.
Em meio
ao frenesi da recepção do hospital, um “jovem” de aparentemente quatro anos
começa uma prosa com a moça de macacão estampado. Acabado o Carnaval, foliões e
foliãs se amontoam entre bancos e poltronas a espera do doutor.
O
pequenino, meio ressabiado com seu encontro de logo mais, dispara a falar:
─”Qual é
o seu nome?”
─ “Luciana”,
respondo.
─ “Nossaaaaa,
será que a gente é parente? Meu nome é Lucas. Nosso nome é muito igual, né?”
Abro um
sorriso e engatamos uma conversa sobre remédios, injeções e os motivos que nos
levam até os hospitais. Ele, acometido por uma suposta virose, precisava de
cuidados. Explicou que “toda hora ia ao banheiro” e que a “mamãe” dele até
sugeriu uma fralda descartável. Mas ele refutou:
─ “Eu
“tô” grande e não preciso disso. Se quiser, que me leve ao “doitor”, disse com
um invejável ar viril.
Mas a
aparente coragem escondia, na verdade, um sentimento genuíno de pânico.
─ “Se
chamarem você antes de mim, você me conta como é?”
─ “Não
se preocupe, não há de ser nada. Você até está com uma carinha boa para quem
está dodói”, analisei, na tentativa de animá-lo.
Entre os
lamentos de dor, de reclamações sobre a espera interminável e do som frenético dos
últimos repiques de samba – transmitidos na pequena TV que tentava,
inutilmente, entreter os candidatos à espera de um diagnóstico – o pequeno
Lucas passou a divagar sobre a vida, sobre o tal do “zica, um mosquitinho bem
pequenininho que pode machucar gente grande, gente pequena e até velhinho”.
─
“Luciana Praxedes, por favor, sala 2”, anuncia um rapaz ruivo, com voz de
tenor.
─
“Chegou minha vez, Lucas. Preciso ir. Você fique calmo que tudo dará certo”,
falo em tom encorajador.
Eis que,
repentinamente, o paciente infantil dispara com um ar confiante:
─ “Tá
tranquilo, tá favorável”.
Eu
esboço um sorriso sem entender ao certo o que a frase quer sugerir.
─ “Pra
você também”, digo com cara de interrogação.
Ao
adentrar na sala 2, o “doitor” é categórico no meu diagnóstico:
─ “É
dona Luciana, não ‘tá´ nada tranquilo, não ‘tá´ nada favorável”.
A tosse,
até então esquecida durante a conversa com o falante mirim, volta a dar o ar de
sua graça. Olho para o médico e penso: o mundo e seus inusitados neologismos.
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