Fiz essa fotografia com o telemóvel, nas Fisgas de Ermelo,
nas margens do rio Olo, (acredite) sem nenhum efeito especial
Nossa, eu
não poderia imaginar que o meu post anterior iria tão longe!
Recebi um
comentário, que eu amei, do amigo Bernardo Nunes (pseudônimo). Diz ele:
Adorei Silvia!! Ainda lembro como nos encontramos, e como ficava
espantada como o meu linguajar, uma mistura de português com sotaque algarvio!
Terá sempre a minha amizade, estima e admiração! Deste seu amigo que lhe
apresentou um pouquinho desta cultura portuguesa, talvez os seus primeiros
contactos diretos! Um abraço para si e seus
Esse meu querido amigo foi a figura mais importante, sem
dúvida, na minha primeira estadia aqui em Portugal. Ele ajudou tudo em tudo (e
mais um pouco) o que estava ao seu alcance. Um Amigo com A maiúsculo, mesmo,
sabe? Dessas pessoas que fazem coisas concretas e importantes para ajudar de
verdade. Amigos assim são raros e a gente tem mais é que cultivá-los vida
afora.
Mas não tive apenas reações simpáticas. Quando escrevi, eu
sabia que estava tocando em alguns pontos sensíveis e polêmicos. Recebi este
comentário anônimo:
Por que você precisa depreciar o Brasil para elogiar
Portugal? Dizer que a cultura e a educação deles “dá de zero” à do Brasil é
fazer exatamente o que você diz que os brasileiros fazem com os portugueses
quando os chamam de “burros”. Cada cultura tem o seu valor e o povo de cada
país é certamente muito feliz dentro da sua cultura e suas tradições.
Eu respondi o seguinte:
Porque eu posso fazer uma declaração polêmica no meu espaço de expressão.
Porque é essa a minha opinião e eu tenho todo o direito de expressá-la. Porque
é verdade. É a dura e crua verdade. Nós, brasileiros, nos achamos grande coisa.
Mas a nossa cultura (educação) é pobre, muito pobre, diante da cultura
(educação) europeia. Infelizmente, é
assim... Talvez eu tenha confundido cultura com educação e são coisas
diferentes, de fato. Mas aqui muitas vezes eu sinto vergonha alheia quando vejo
o baixo nível (sob ambos os aspectos, cultural e educacional) dos brasileiros
que aqui estão a tentar construir uma vida melhor para si próprios, seus
descendentes e às vezes até para os parentes que ficaram no Brasil. É muito
triste, mas é a verdade. E a verdade nua e crua às vezes nem é bonita. Só que
isso não é depreciar. Mas sim olhar com frontalidade. Admitir que é assim. E
isso não me deixa nem um pouco feliz. Se você, anônimo, quer saber... fico bem
triste com essa constatação.
Agora, tradições... Hummm, pegue, por exemplo o bairro de Pinheiros, com
aqueles enormes arranha-céus e seus estúdios de 20 metros quadrados. Cada vez
mais a paisagem da "minha" cidade deixa-se dominar por esses monstros
de vidro e cimento. Onde foram parar as casinhas de vila (onde eu mesma morei e
fui feliz durante alguns anos)? O comércio local? Ou, em outras palavras, a
nossa tradição? E posso estender a pergunta a vários outros bairros de São
Paulo, As construtoras dominam o urbanismo, que não existe. Nossa história e
nossas "tradições" se perdem em cada esquina. Aqui, tudo é muito
diferente. Tudo permanece. Tá bom que metade do país (modo de dizer) está em
ruínas de pedra, casas que o tempo destruiu. Mas que, veja só, os próprios
brasileiros estão comprando e reconstruindo. Isso eu acho incrível. Tem um
monte de canais no YouTube de brasileiros que compraram casas aqui, caindo aos
pedaços, e, a duras penas, reconstroem tudo com as próprias mãos. Tem isso
também. Tem muito pra contar, pra dizer dessa experiência de mudar de país.
Obrigada pela indignação e pela pergunta, caro Anônimo. Seria legal e educado
me dizer seu nome.
Depois, fiquei sabendo que era a minha filha – imagine – que
me respondeu pelo Facebook e continuou a desenvolver o raciocínio dela:
Meu nome é Biba. E vergonha eu tenho de você por falar
isso sobre o seu país. O Brasil tem dimensões continentais e você está
reduzindo ele ao bairro de Pinheiros? Sério? Isso que São Paulo é
literalmente uma das cidades mais multiculturais do mundo. Como você tem
coragem de dizer que nosso país não tem cultura? Quanta cultura a gente não tem
na Amazônia, Pará, na Bahia, Recife, e etc? Como você não valoriza um país com
uma cultura riquíssima influenciada por povos originários indígenas, povos africanos
e até os próprios Europeus que você tanto admira? Temos um legado mundial no
âmbito da música, da culinária, das artes, artesanatos, literatura, festas
tradicionais em todas as regiões do Brasil. Vergonhoso é você ter coragem de
dizer que você sente vergonha alheia quando vê brasileiros estão a tentar
construir uma vida melhor para si próprios, seus descendentes e às vezes até
para os parentes que ficaram no Brasil. Pensa bem. Esse papo saudosista de
"era bom quando" é vazio e não se sustenta. A gente está em 2024, o
tempo passa, as coisas mudam. Quando você acha que "era bom quando
x", para muitas pessoas mais velhas naquela época também "era bom
antes de x". Envelhecer é mudar. O mundo está em constante mudança e
rejeitar isso é rejeitar a vida como ela é. E você que se sente tão orgulhosa
por aprender novas palavras, devia também aprender a se adaptar às mudanças da
vida, afinal você nunca vai conseguir combatê-las. E digo mais, é contraditório
você esperar que as coisas continuem sempre iguais. Em Portugal, "tudo"
não permanece também. Como você mesma disse, existem casas em ruínas que os
próprios brasileiros (dos quais você tem vergonha) estão reconstruindo. Os
jovens estão indo embora, o país, de norte a sul está sendo tomado por
estrangeiros que aumentam a especulação imobiliária e fazem com que idosos não
consigam mais pagar as suas rendas. Na zona onde eu moro, em Carcavelos, estão
acabando com uma área de preservação ambiental para fazer 8 torres de prédios,
um hotel e um shopping center. Como que "tudo permanece" em Portugal?
Pelo amor de Deus. Discursinho vazio e xenofóbico com o seu próprio povo o seu.
Parabéns.
Eu:
Ahh era você!!! Mas sim, a questão é muito mais complexa
do que o que eu escrevi e o que você acrescentou (tirando os adjetivos que usou
para me colocar em alguma “caixinha” onde eu não caibo) complementa muito bem,
Biba. Concordo com tudo o que você falou também. Mas eu acho que você não
entendeu muito bem o que eu escrevi lá no blog. Senão tinha dispensado esses
adjetivos pouco elogiosos que usou pra mim. Eu não desprezo de jeito nenhum o
Brasil e muito menos os meus conterrâneos, os pobres brasileiros. Só lamento
que todos os políticos que governaram aquele país não conseguiram criar
condições de educação dignas para toda a nossa população. Lamento profundamente
que a nossa educação seja tão fraca. É isso é o que verifico aqui. Mas eu vejo
muito valor na nossa gente e na coragem que muitos têm de vir tentar melhorar a
vida por aqui. Como eu falei no que escrevi para você. A realidade não é
simplesmente preto e branco. É colorida e tem muitos lados. Portugal tem muitos
problemas também. Essa questão da moradia é um deles. Bom… acho que isso daria
um livro. Vou parar por aqui.
A resposta dela foi:
Eu usei as palavras que você mesma usou para se referir
aos brasileiros aos quais você sente vergonha. E eu não me referi a você no meu
comentário, mas ao seu discurso. Porque você elogiar Portugal é uma coisa,
agora você fazer isso depreciando o Brasil, a cultura brasileira e o povo
brasileiro, é outra bem diferente. Já bastam pessoas estrangeiras mal
informadas falando mal do nosso país, você não precisa se juntar a eles e aos
argumentos vazios que eles tem. Eu entendi muito bem o que você escreveu, mas
me atingiu diretamente e me machucou. Talvez você não tenha se expressado da
maneira que você pretendia.
Agora você fala de política, acessos etc, mas no seu
texto e no seu comentário você não abordou nenhuma dessas temáticas e foi a
eles que me referi. A educação brasileira pode ser fraca em termos de sermos um
povo “culto” (no que se refere ao tradicional), mas ainda somos um povo
educado. Somos um povo alegre, um povo que se diverte com pouco, um povo
completamente aberto às diferenças, aberto a aprender, somos interessados.
Somos hospitaleiros com estrangeiros, curiosos com diferentes culturas. Acho
que tudo isso pode valer muito mais do que sermos “um povo culto”. Tenho muito
orgulho de ser brasileira!
E eu:
Pois é... Não coube tudo nesse meu primeiro post. Eu vou
voltar ao assunto. Uma parte do que você fala é verdade. E os portugueses
também são parecidos conosco, em muitos exemplos que você dá. Inclusive, muitos
dos nossos comportamentos herdamos deles (para o bem e para o mal,
atenção!). Mas as generalizações é que são o problema. Por isso que eu falei
que era melhor escrever um livro.
Vou fazer outro post, mais completo, e vou levar em conta
tudinho o que você falou. Eu também tenho muito orgulho de ser brasileira.
Muito. Eu escrevi no calor da emoção do momento. Não tive a intenção de ferir
ninguém, muito menos a minha filha. Eu me vali de uma expressão em moda hoje,
que é o "lugar de fala", Posso falar do Brasil e dos brasileiros,
justamente porque sou brasileira. Posso falar de São Paulo, porque sou
paulistana. E posso falar de Portugal porque moro aqui. Portanto, eu só falo do
que me sinto confortável para falar. Não posso falar do Pará (nunca estive lá)
e nem da Bahia, que já visitei, mas pouco conheço. Enfim... essa conversa vai
longe.
Ela ainda me disse:
Se você não conhece todo o Brasil, é complicado você se
dar esse lugar de fala para falar do Brasil e dos Brasileiros.
E eu:
Então quer dizer que só quem conhece o Brasil inteiro
pode falar do Brasil? Esse conceito exclui muita gente. Não acha? O fato de eu
ser brasileira não me credencia a falar do Brasil que eu conheço?
Marjorie / Biba:
Mas você não falou do Brasil que você conhece. Você generalizou o Brasil
inteiro como se ele todo fosse o Brasil que você conhece.
Eu:
Eu errei. Vou escrever mais para tentar corrigir esse mal entendido. Vou
fazer esse adendo.
Ela achou que meu post deprecia o Brasil. Não concordo. Não
quero depreciar o Brasil, só quero olhar para o país com objetividade, com
imparcialidade e ver que ele tem qualidades e também defeitos (muitos). A
cultura brasileira “verdadeira” tem o seu valor. Mas o que é a cultura
brasileira, hoje em dia? O que vejo é uma cultura dominada por estrangeirismos –
de um lado – e por uma falta de educação atroz – de outro. Falta educação ao
brasileiro para que ele possa apreciar a arte, a literatura, a música clássica.
Fico triste com isso. É uma questão complexa, que tem inúmeros fatores a
influenciar o nosso pobre país. Sem falar nos políticos corruptos, eleitores
pouco preparados, discursos de medo e de ódio, fake news, etc, etc, etc.
Sinto uma enorme compaixão pelo Brasil e pela nossa gente.
Um povo alegre e feliz, como diz a minha filha, mas grande parte da nossa
população não tem condições minimamente dignas de sobrevivência. Isso me deixa
muito triste. O abismo social no Brasil é profundo e extremamente doloroso.
Dados do IPEA (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada) de
2023 revelam que “o Brasil é conhecido por sua alta concentração de renda, onde
o 1% mais rico da população detém 28,3% da renda total, tornando-o um dos
países mais desiguais do mundo”. Como não se entristecer diante desses
números?
Cada brasileiro desses 600 mil que decidiram mudar de vida e
vir para cá merece todo o meu respeito e admiração. Mas é verdade também que
quando muitos deles começam a falar, me dá tristeza (que eu erroneamente,
segundo a minha filha, chamei de vergonha alheia, no outro post). Para
mim, a vergonha alheia significa justamente me identificar com aquela
pessoa do meu país e perceber que ela não teve acesso a uma boa educação, a
leituras, a diferentes manifestações artísticas e, assim, fica em desvantagem
aqui na batalha por um lugar ao sol, uma vida digna e boa.
A falta de educação (e não de cultura, porque eu confundi esses
dois conceitos diferentes) é lamentável. Que falta que faz um ensino de
qualidade!
Meu genro também fez um comentário no Facebook:
Nossa cultura da de 10x0 sogrinha. A única coisa que o mundo conhece de
Portugal é o Cris. Agora sobre o Brasil....
Eu:
Eu sabia que estava a ser polêmica! Rsrs Nunca quis menosprezar o Brasil e
talvez tenha misturado um pouco os conceitos de cultura e educação. Esse foi o
meu erro.
Ele concordou comigo:
Acho que sim.
Depois, também uma leitora do meu livro Destino Algarve
me disse no Facebook: Te admirei muito por causa de seu livro, achei muito
interessante. Mas não concordo com suas opiniões políticas.
E eu respondi:
Tá ótimo! Eu nem espero e nem quero que as pessoas concordem comigo. Não
levanto bandeiras. Só me dou ao direito de expressar meus pensamentos e
sentimentos e acho que todo mundo deveria fazer o mesmo. Pensar, refletir,
chegar às suas próprias conclusões. Por isso ainda mantenho meu blog
ativo, para escrever quando eu quiser, sobre o que eu quiser e sentir vontade.
Tudo é tão efêmero nessas redes sociais. No blog, pelo menos, fica lá (aqui).
Dá pra voltar depois de anos, reler, repensar...
Com esse post gigante, quero deixar registradas aqui
diversas opiniões e dados sobre as novas relações Brasil – Portugal.
O objetivo é que cada um leia, pense, reflita e tire as suas
próprias conclusões.
Só não permito que sejam “colados” em mim rótulos, tais como
que meu discurso é vazio (não é) ou que eu sou xenofóbica (era só essa que me
faltava… xenofóbica, eu?? Nesse caso eu teria ficado quieta no Brasil e nunca
teria me casado com um português, ora essa…)
Também nunca manifestei que “antigamente que era bom” – não é
nada isso. Eu sou a pessoa mais adepta a mudanças deste mundo. Tanto que mudei
a minha vida de cabeça para baixo, aos 64 anos de idade. Amo mudanças. Menos as
que desrespeitam a história e o legado arquitetônico, urbanístico, sociológico,
cultural, humano etc. dos nossos antepassados. Espero ter sido mais clara e ter
feito uma abordagem mais completa desta vez.
E você? O que pensa sobre essa invasão dos brasileiros em
Portugal? Será que eles aproveitam o fato de estarem na Europa e conseguem
aproveitar pelo menos parte da cultura do país que os acolhe?