terça-feira, outubro 29, 2024

Porque não preciso mais de terapia

 

Um dia de sol no Parque D. Carlos I, Caldas da Rainha
(Fotografia: Silvia Regina Angerami)

EM CELEBRAÇÃO AOS 21 ANOS DESTE BLOG, COMPLETADOS HOJE (DUVIDO QUE HAJA UM BLOG MAIS ANTIGO EM PLENO, ASSIM COMO O MEU... SERÁ??), PUBLICO O TEXTO ABAIXO, FRUTO DE UMA REFLEXÃO SOBRE A MINHA VIDA ATUAL (espero que seja útil e inspirador para mais alguém) 

* * *  

Correndo o risco de parecer pretensiosa demais aos olhos das minhas amigas e amigos psicólogas e psicólogos, e já a mergulhar em mais uma polémica, atrevo-me a afirmar que sinto na minha alma que não preciso mais de terapia. Atenção! Não se engane. Sou uma defensora da terapia. Acredito que ela pode ajudar muita gente e já me ajudou demais. Ainda recorro, eventualmente, à minha querida terapeuta Márcia, quando sinto necessidade e ela SEMPRE me ajudou e ajuda.

Mas atingi recentemente uma tal clareza de raciocínio, e não só, de sentimento também, que faz com que eu me sinta, finalmente, “em casa”. E olha que nem moro mais no país onde nasci. Há dois anos, no dia de hoje, embarquei para a maior aventura desta minha vida.... Amanhã completam-se dois anos ininterruptos de Portugal. Considero essa marca um feito e tanto.

No começo, quando aqui cheguei, vivia ansiosa, por vários motivos. Porque estava frio e eu não estava psicologicamente preparada para aquele primeiro outono/inverno da minha segunda temporada europeia (a primeira fora em 2007/2008 no Algarve). Porque a reforma da casa não tinha sido concluída, devido a sérios percalços enfrentados pelos nossos senhorios (e não por culpa deles e nem de ninguém, não acredito em culpas). Porque não tinha o visto de permanência e ele demorou mais do que os três meses que temos de praxe. Eu me sentia ilegal, embora estivesse a viver com meu marido português, e isso tirava o meu sono. Porque muitas vezes não entendia o que o meu marido dizia e ele se chateava com a nossa dificuldade de comunicação. Porque… mil outras razões.

Felizmente essa época passou, ficou pra trás. Hoje sou casada legalmente, no “papel” como se diz, entendo 90% do que dizem os portugueses (incluindo meu marido) e me sinto finalmente em casa.

Desde pequena sentia dentro de mim uma espécie de inadequação. Nunca me sentia bem em lugar algum. Na escola, apesar de boa aluna, eu tirava notas boas sem me esforçar muito e não via mérito naquilo. Não era nada demais. Mais tarde, continuei a me sentir sempre uma estranha no ninho na faculdade, nos empregos então, nem comento. Tinha uma vontade inexplicável de mudança, de mudar os móveis de lugar, de mudar de casa. Até que essa vontade de mudança culminou no fim de um casamento de mais de 40 anos.

— Separar agora?? Por que?? Como assim??

Muita gente condenou a minha atitude. Se não frontalmente, porque nós, brasileiros, nem sempre somos frontais (o que não é um elogio), provavelmente pelas costas. Eu sei, simplesmente sei.

Mas eu ainda tinha uma pontinha de esperança de encontrar a paz, e sabia que naquela situação eu jamais a encontraria, pois tinham-se esgotado todas as possibilidades.

Nem digo que queria encontrar o amor, porque não queria. Ou melhor, não acreditava que fosse possível uma pessoa com mais de 60 anos encontrar o verdadeiro amor da sua vida. Se você me dissesse isso, eu iria rir na sua cara. Aliás, foi o que fiz quando a minha amiga e taróloga *Priscilla Tavollassi* me disse que eu ia me casar novamente.

— Quem? Eu?? Kkkkkk

Mas daí, veio o Destino e pumba! Me apresentou ao homem dos meus sonhos e não estou a brincar.

Uma amiga minha da faculdade tinha me contado que fizera uma lista de todas as características do seu futuro amor e que, de fato, ele aparecera em sua vida. Não apenas físicas, mas de caráter e tudo o mais que ela considerava profundamente necessário em um relacionamento.

Fiz o mesmo. Trabalhei em uma lista completa da pessoa com quem eu desejaria me relacionar e esqueci a lista em um dos meus cadernos. Fui viver a vida e aproveitar o momento. Fiz tudo o que eu achava que era meu direito, naquela altura.

Um belo dia (aliás, não foi um dia qualquer, foi no dia do aniversário da minha avó paterna, se ela fosse vida), conheci o meu atual marido e começamos a perceber que havia muito em comum entre nós. Depois de muito tempo, a tal lista reapareceu e eu conferi: estava tudo ali. Menos um item: eu pedi alguém que morasse no mesmo bairro, em São Paulo. E o Destino foi lá e me apresentou alguém a 8 mil quilômetros de distância. Não se pode querer tudo nesta vida…

O que seria uma desvantagem, tornou-se a maior vantagem que eu poderia imaginar. Me mudei e aqui estou eu a viver uma nova vida. No começo, os desafios foram enormes. Enormes e doloridos. Enormes, mas transponíveis. E o nosso profundo amor sustentou tudo. Atravessamos pântanos de dor e de medo. Mas estávamos sempre juntos e de mãos dadas.

E cheguei até aqui, onde estou hoje. Sinto-me acolhida, protegida e amada, como nunca em toda a minha vida. Sinto-me em casa. Aprendi, a duras penas, e diferenciar as coisas que posso modificar das que não posso.

Rezo todos os dias aquela oração atribuída a São Francisco de Assis, que diz assim:

“Senhor, dai-me força para mudar o que pode ser mudado...

Resignação para aceitar o que não pode ser mudado...

E sabedoria para distinguir uma coisa da outra”

Aprendi a enxergar e a aceitar a Vida como ela é. As pessoas como elas são. E a agradecer e a usufruir os dias felizes, calmos e tranquilos que eu vivo por aqui.

(Se ainda não viu, veja o filme Dias Perfeitos, que ilustra muito bem o que eu disse acima)  

Amo o contato maior com a natureza que eu tenho aqui. Amo ver o céu inteiro (e não só uma fatia dele), quer seja azul ou cinzento, a lua, em suas fases distintas, as nuvens em seus formatos variados. As árvores, a vegetação, as minhas plantinhas aqui em casa a crescerem saudáveis, a lagoa de Óbidos, a Poça do Vau, o Paúl da Tornada, o parque Dom Carlos I nas Caldas da Rainha, a mata Rainha D. Leonor, a serra da Amoreira. O mar, o horizonte. Conhecer o país, de Norte a Sul, de Leste a Oeste, na nossa “latinha” (nosso carro velhinho e econômico).

Tudo com o que eu sempre sonhei faz parte hoje da minha vida. Mas atenção! Não falo de “coisas materiais”. Viver com simplicidade, dignidade e na melhor companhia, isso sim. É isso que vale. Vale a pena viver e usufruir de tudo isso. E eu agradeço, agradeço, agradeço.

Não posso contentar todo mundo. Mas nem Jesus Cristo conseguiu isso, então estou em paz comigo mesma e com a minha consciência. “Paz, amor e saúde “: brindamos a isso com vinho, mas também com iogurte, com o cafezinho, com chás de ervas, com sumo de frutas, com qualquer bebida.  

Portanto, no meu caso, agora, em especial, a terapia não é mais necessária. Isso não é maravilhoso??

Meu conselho (que ninguém pediu, mas eu dou assim mesmo) é:

Faça o que o seu coração mandar. Ele geralmente não se engana. E não tente contentar todo mundo. E, se preciso for, faça terapia, que também ajuda. 


4 comentários:

  1. Anônimo12:52 PM

    Feliz aniversário e parabéns pela vida nova !! Sua calma sempre me encantou, você é encantadora. Seu texto/vida é emocionante e um exemplo. Beijos naninha

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  2. http://antonior-ocantodafenix.blogspot.com/1:44 PM

    Minha querida,

    Partilhei a tua publicação no Facebook que encaminha para esta página, no meu puco activo perfil nessa rede social. Nessa partilha, inseri um texto introdutório que diz o seguinte:

    "Há publicações que nos alimentam a chama quotidiana que aquece e ilumina a consciência de estar a partilhar, com a pessoa que se ama por ser exactamente como é, o tempo certo no lugar que o bom destino agora nos dá e, como tal, é o que deve ser..."

    É assim mesmo. O tempo que passámos tem sido uma construção, uma edificação espiritual que se solidificou com todos os acontecimentos que lhe foram dando forma. A essência que se vai depurando para um estado de graça progressiva resulta de todos os bons momentos, de todas as alegrias, das partilhas felizes, dos contributos dos bons amigos que nos apoiam e estimulam, daqueles tantos que se sentem inspirados pela nossa história, mas também pelas dores e sofrimentos, pelas tentativas de nos tornarem a magia em fel, pelas pedras que aparecem e as que nos são colocadas no caminho. Tudo isso é a matéria que, ao passar pela força dos nossos afectos recíprocos, nos tem traçado o caminho do que sempre assumimos: - Viver a vida como a obra de arte suprema!
    Conheci-te a fazer terapia e sempre te disse que aspirava pelo dia em que sentisses o que agora acabas de expressar.
    Como sabes, por acaso da minha vida, sempre tenho tido amigos próximos, psicólogos, terapeutas que exercem psicologia clínica no seu quotidiano e, por isso, tenho uma visão especial sobre as suas potencialidades e riscos. Nada tenho contra uma boa relação entre terapeuta e paciente. Os proveitos podem ser decisivos para uma saúde e independência emocional que assegura o bem estar.
    Felizmente atingiste um estado de esclarecimento na tua consciência que te dá essa independência. É privilégio meu e felicidade testemunhar esse facto.
    Que todos os que necessitam de encontrar esse caminho encontrem um bom terapeuta que os ajude a esclarecer também a sua consciência e a atingir paz interior.

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  3. Anônimo4:51 PM

    É maravilhoso ter coragem de se reinventar.

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  4. Anônimo9:15 PM

    Nossa que delícia texto. Sempre bom saber de vocês querida bjs

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